• A Tarde
     Mestre Pastinha tenta reviver, na miséria, o seu passado de glórias 
    5 de maio de 1979

    O texto

    • página

      -

      A Academia de Capoeira de Vicente Ferreira Pastinha ou Pastinha, um dos capoeiristas mais conhecidos do país, está reaberta desde Fevereiro. Pouca gente sabe, no entanto, tomou conhecimento do fato, pois até o momento não foi divulgado que no número 51 da Rua Gregório de Matos, no Pelourinho, antigos alunos da capoeirista se reúnem ás terças, quintas e domingos, a partir das 17 horas, para cantar e jogar capoeira.

      Junto com Mestre Pastinha, nos seus 90 anos, cantam e jogam capoeira a sua mulher Maria Romélia, João Grande, João Pequeno, Ângelo Romero, Valdino e Papa Amarelo, os alunos mais velhos do mestre. "Mas a academia ainda não tem alunos, porque todo mundo que aparece só quer ter aula de graça, promessas tem muitas". Se queixa Maria Amélia [Romélia].

      ABANDONADO

      Mestre Pastinha está muito doente, passa os dias deitado em um banco no corredor do prédio nº 14, no Pelourinho, onde ocupa dois pequenos cômodos, sujos e escuros. Pouco fala quando está acordado e sua mulher é quem faz todas as queixas. A academia, que funcionava anteriormente no prédio onde está instalado o SENAC, no Pelourinho, foi fechada quando se iniciaram as obras de recuperação do conjunto arquitetônico. Segundo Maria Romélia, todo o material da academia desapareceu e não adiantou ir á Fundação do Patrimônio do Pelourinho para saber do paradeiro. Daquela época até os dias de hoje, o abandono e a exploração acompanharam o Mestre Pastinha, como fica claro nas palavras de sua mulher:

      - A gente só recebe promessas, de muitos amigos, escritores, jornalistas que vêm aqui, mas dinheiro que é bom a gente não consegue nenhum", Maria Romélia diz estar cansada de tanto ver a exploração do Mestre Pastinha. Segundo ela, muitos livros foram escritos, reportagens feitas, filmes e apesar disso não renderam nenhuma compensação financeira para eles. Ela chega a fazer um apelo:

      - Não façam shows dizendo que a renda é em benefício dele porque a gente não vê este dinheiro. Eu peço também que não usem mais o nome de Pastinha em músicas e apresentações, porque depois ele não tem direito a nada.

      FAMOSO E POBRE

      Na verdade, a fama conseguida através dos anos nada trouxe de bom para os dias finais do Mestre Pastinha. "Vêm fotógrafos aqui, tiram fotos dele e vendem por 700 cruzeiros", diz Maria Romélia. Enquanto isso, o casal sobrevive com uma subvenção conseguida no primeiro governo de Antônio Carlos Magalhães e do dinheiro que Maria Romélia consegue com a venda de acarajés, quando pode, na porta do Hotel Pelourinho.

      A doença do Mestre Pastinha é a velhice, está cego e não joga mais capoeira, por causa disto. Quando tem dinheiro, segundo Maria Romélia, ela chama um médico e compra remédios, quando não tem ela pede e consegue alguma coisa. Mas acha que ninguém tem obrigação de dar nada de graça, assim como o Mestre Pastinha, não tem obrigação, também, de ensinar de graça.

      Há algum tempo a Philips gravou um disco de capoeira, com o Mestre Pastinha. Agora Maria Romélia está tentando conseguir dinheiro para uma passagem de ida e volta ao Rio de Janeiro, onde tentará regravar o disco. "Ou se pelo menos, um banco desses financiasse a regravação ou lançamento de um livro seria bom."

      Livro este que poderia contar a vida deste ex-funcionário civil da Marinha, ex-pintor de paredes, ex-bicheiro, ex-desordeiro, ex-vendedor ambulante, e ex-leão-de-chácara de casa de jogo, de quem, há muito tempo já se previu um destino triste: "Vai morrer pobre, doente, mas famoso".


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