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     VEM A PORTO ALEGRE A AUTÊNTICA BAHIA: CAPOEIRA E ARTE POPULAR 
    10 de março 1959

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    M Pastinha, 1959

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      Vem a Porto Alegre a autêntica Bahia: capoeira e arte popular
      Diario de Noticias, Porto Alegre
      10 de março, 1959

      Juntamente com as „carrancas“ do Rio São Francisco, serão apresentados os maiores jogadores de capoeira da Bahia

      SALVADOR, março De Glênio Peres, nosso enviado especial) – Juntamente com as famosas «carrancas» do Rio São Francisco, com as peças de arte popular da Bahia, a exposição de gravuras e de poesia ilustrada, irá a Pôrto Alegre, também, uma equipe composta dos mais famosos jogadores de capoeira, de Salvador, para demonstrações em praça pública na capital dos pampas.

      A viagem dos capoeiristas baianos está pràticamente assentada, graças à boa vontade encontrada pela Diretoria de Turismo de Salvador, junto ao mais famoso dos mestres da capoeira, Pastinha, que com mais de sessenta anos de idade dirige e atua em sua Academia de Angola. Dêste núcleo de ensino e exercício da capoeira irão cêrca de 10 jogadores, autênticos bailarinos e expoentes da capoeira na Baía, juntamente com os músicos e instrumentos típicos necessários às demonstrações.

      Para que os leitores do DN tenham um esclarecimento preliminar do que seja a capoeira, sua história e importância nos costumes do nordeste, transcrevemos abaixo um excelente artigo sôbre o assunto, assinado pelo jornalista Paulo Gil, dos Diários Associados da Baía, e um dos grandes entusiastas da próxima exposição a ter lugar em Pôrto Alegre, no mês de abril vindouro:

      „CAPOEIRA – ARMA DE [ATAQUE] E DEFESA

      Com os navios negreiros chegaram os primeiros escravos da região de Angola e com êles a capoeira – arma de ataque e defesa, talvez hoje a mais popularizada das nossa manifestações folclóricas.

      Motivo de atração turística, se fôr devidamente explorada e amparada pelas nossas autoridades, a capoeira poderá constar do nosso calendário folclórico. Existindo vários centros na cidade, não se torna difícil ao turista conhecê-la de perto. Basta, para tanto, que realmente esteja interessado em conhecer o nosso lado humano. Vale reassaltar que a capoeira, salvo nos centros onde se pratica «Angola», vem perdendo seu caráter de dança, de «vadiação», para voltar a ser o que era, em suas origens.

      A capoeira exige, para maior ou menor aceleração da luta, uma série de variação de toques que comandam o jôgo. Daí designações de toques que a todo momento podemos ouvir nos centros de capoeira: São Bento Grande, jôgo ligeiro; São Bento Pequeno, jôgo que é quase um samba; Santa Maria, lento; Amazonas, médio, Iúna, Rasteiro.

      Quando entram elementos estranhos, temos um toque especial, o Banguela, por exemplo, para o jôgo em que um dos jogadores tem uma faca na mão. No passado, quando existiam grupos rivais de capoeiras havia um toque especial que alertava os capoeirista para qualquer eventualidade: por exemplo à chegada de alguém não afeito à roda. Era o Cavalaria.

      JOGADORES FAMOSOS E LENDAS

      Circularam diversas histórias a respeito de jogadores que tinham o „corpo fechado“ a bala e a faca. Besouro, Pantalona, Cazumbá e Samuel Querido-de-Deus, famosos desafia- Valdemar, Sete-Molas, Traíra e mais reverenciados do passado. Entre os atuais estão Pastinha, para si a regionalização da cadores[?] da polícia, são os nomes Mestre Bimba, que pretende poeira.

      Pastinha já é um velho de mais de 60 anos e nem por isto deixa de dançar no Centro de Capoeira Angola todos os domingos. Pastinha tem o seu Centro no Pelourinho, onde, conservando a tradição pura de Angola, transmite aos seus alunos aquêles mesmos passos que marcaram a vida de muito escravo em engenhos e senzalas. Quando dança, o faz de maneira virtuosa, com perfeição quase de bailarino e por mais evoluções que realize sôbre o chão, não suja roupa branca. Esta é a grande qualidade dos mestres: Dançar sem sujar a roupa.

      Como Pastinha no seu Centro, temos ainda na Liberdade, dois mestres que se dedicam ao ensino da „Angola“. São êles Valdemar e Sete Molas. Êste último famoso pela malícia com que joga, daí a alcunha por que é conhecido.

      COMO NASCEU A CAPOEIRA

      Os praticantes de Angola jogam apenas por prazer. Procuram apenas divertir-se e não têm outras regras afora tocar o chão com os pés e as mãos.

      A capoeira era para os negros escravos uma arma de ataque e defesa contra europeus, que a desconheciam. Nesta luta as mãos eram substituídas pelas pernas e pela cabeça. Tinham caracteristicas de luta realmente mortal com seus golpes fulminantes.

      Prevendo as conseqüencias que poderiam advir da constance prática dêste jôgo, os senhores de engenho – donos da terra e dos escravos – procuraram extinguí-la com a proibição da sua prática. Apesar dos esforços não conseguiram destruí-la porque os negros a camuflaram. Transformaram a luta numa espécie de dança alegre através da qual treinavam aprimorando os golpes ao som de palmas e cantigas. O senhor não percebia a luta em seu novo aspecto. Gostava de vê-los jogando „Angola“.

      E a capoeira subsistiu com êste caráter de dança.


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