• Correio Braziliense
     Mestre «Gato» o Capoeirista 
    16 de dezembro 1976

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    M Gato Preto, 1976

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      MESTRE „GATO“ O CAPOEIRISTA
      Correio Braziliense
      16 de dezembro 1976

      Irlam Rocha Lima

      Em 1966 quando o Brasil participou do I Festival da Arte Negra, nos Estados Unidos [na verdade em Dakar, Senegal - velhosmestres.com], ele estava entre os convidados pelo Itamarati para representar o País, ao lado de gente como, Camafeu de Oxossi, Pastinha, Ataulfo Alves, Heitor dos Prazeres, Paulinho da Viola e Elizete Cardoso.

      Em julho último, esteve nos EU. Juntamente com a babalorixá Olga de Alaketo e mais um grupo de 13 pessoas ligados à arte e ao folclore baiano, participou de um festival denominado „Diáspora Africana“, que visou a demonstrar as raízes e origens africanas e suas ramificações pelas Antilhas e América Latina.

      É Mestre „Gato“, um capoeirista tão bom quanto os famosos Bimba, Pastinha, Cobrinha Verde, Waldemar, Canjiquinha, Traíra, Lúcio Goes (seu pai) ou o lendário Bezouro.

      Mestre „Gato“ está em Brasília. Aqui vai se fixar por algum tempo, montar uma academia, ensinar os segredos da capoeira para os brasilienses e mostrar a arte que já foi aplaudida por grandes platéias na França, Portugal, Estados Unidos, México e Nigéria.

      „PARECE UM GATO“

      „Esse menino de D. Luzia parece um gato. Vai acabar na capoeira também“. Foi de tanto acharem ele parecido com gato, que acabou sendo chamado de „Mestre Gato“. Capoeirista há 32 anos, aos 19 já era considerado um „bamba“. Aprendeu capoeira com seu pai Lúcio Goes, „pois naquele tempo não existiam livros sobre o assunto,

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      ninguém, ainda, discutia se era arte ou esporte. Era, apenas, uma prática negra, africana, e cercada de muito misticismo, que o tempo se encarregou de deluir“.

      Fase de ouro das rodas de capoeira. As academias ainda não existiam e a capoeira era privilégio de poucos, sua técnica passada de boca em boca, de pai para filho. Os capoeiristas formavam um grupo fechado, originário das camadas mais humildes da população.

      As primeiras academias viriam surgir por volta de 1955. A de Bimba, em Amaralina e a de Pastinha, no Pelourinho. Nesse tempo, Mestre „Gato“ se tornou o mais jovem „Mestre“. Ganhou os primeiros alunos, organizou os primeiros grupos. Seu trabalho começou a ser notado. Já em 66 fazia sua primeira viagem ao exterior, foi aos Estados Unidos [Dakar, Senegal - velhosmestres.com], convidado pelo Itamaraty. Daí prá cá esteve sempre viajando, pelo Brasil e por outros continentes, mas com suas raízes sempre presas à Bahia.

      ARTE E OFÍCIO

      Os aplausos, os troféus e os diplomas de Honra ao Mérito, conquistados no longo de sua carreira, porém, não são suficientes para dar o sustento à sua família. Com muita dificuldade vem mantendo, sem o menor apoio oficial, duas academias na Bahia. Uma na Rua do Báu, na Garcia e outra na Boca do Rio. Quem toma conta são dois discípulos seu: o filho Gatinho [M Zeca, José Souza Góes] e Espinho Remoso.

      Ensinando capoeira, o que recebe dos alunos é muito pouco e para levar uma vida digna, recorre a outros ofícios, dos quais é também mestre: ferreiro e fazedor de berimbau. Quando não está ensinando capoeira, ou mostrando sua arte em entidades culturais e turísticas, está ocupado fazendo objetos em ferro ou madeira.

      Dizem, que ningéum sabe fazer um berimbau como ele, na Bahia, onde também, já foi escolhido o melhor tocador [em 1970 - velhosmestres.com]. E é este reconhecimento público de suas enormes virtudes artísticas, que não lhe deixa abater. Estas compensações, o respeito povo e o carinho dos seus filhos que o faz continuar na luta.

      EM BRASÍLIA

      „Agora estou em Brasília. É uma nova etapa da minha carreira. Vim em busca do desconhecido. Quero trazer meus conhecimentos para os habitantes desta cidade. Para isso vou montar uma academia, onde ensinarei capoeira para crianças e adultos. As moças, também, poderão participar“.

      Desde segunda-feira que Mestre „Gato“ vem recebendo matrículas de alunos na academia que vai funcionar no Grêmio Esportivo Braziliense, localizado na „Park Way“. Ele pretende ensinar além de capoeira, o maculelê, samba de roda, birimbau; e formar um grupo folclórico, para apresentações em teatros, escolas e em entidades culturais.

      Aos 40 anos ainda ágil e flexível como um garoto, Mestre „Gato“ vai começar uma nova fase em sua vida. Conheceu a glória, viajou pela estrangeiro, recebeu aplausos e homenagens, criou seus filhos e continua dia após dia a luta pela sobrevivencia. Com duas armas: sua arte de capoeirista e seu ofício de ferreiro.


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